Assassinato de presidente mergulha Haiti em crise e amplia instabilidade

Um grupo de homens com fuzis de assalto assassinou na madrugada de ontem o presidente haitiano, Jovenel Moise, e feriu a mulher dele em sua casa nas imediações de Porto Príncipe, mergulhando a nação mais pobre do Hemisfério Ocidental em uma crise potencialmente desestabilizadora.

O ataque, que as autoridades haitianas atribuíram a “mercenários”, ocorre em meio a meses de instabilidade política e violência de gangues, que corroeram de maneira crítica o estado de direito no país caribenho de 11 milhões de habitantes.

Moise, de 53 anos, dissolveu o Parlamento em janeiro de 2020 e governou por decreto enquanto opositores e manifestantes exigiam sua renúncia. Gangues armadas com alianças pouco claras assumiram o controle de áreas do país, aterrorizando a população com sequestros, estupros e assassinatos.

O primeiro-ministro Claude Joseph declarou estado de emergência – que concede mais poderes ao Executivo – e anunciou que estava no comando do país, apesar de Moise ter nomeado um substituto para ele na segunda-feira. Joseph disse que os agressores falavam espanhol e inglês, em um país onde as línguas oficiais são o francês e o crioulo.

O embaixador do Haiti em Washington, Bocchit Edmond, disse que os assassinos eram “mercenários profissionais” que se fizeram passar por agentes do departamento antidrogas dos EUA (DEA) e possivelmente fugiram do país por terra, pela vizinha República Dominicana, pois o aeroporto estava fechado. “Foi um ataque bem planejado”, disse a jornalistas. “Temos um vídeo e acreditamos que eram mercenários.” A República Dominicana reforçou sua presença militar na fronteira de 380 km com o Haiti, fechada logo após o assassinato de Moise.

A primeira-dama Martine Moise foi transferida para Miami. Fontes disseram à mídia local que seu estado era crítico.

Analistas consideraram pouco clara a situação no Haiti. Joseph declarou estado de emergência, algo que apenas o Parlamento poderia fazer, disse Georges Michel, um historiador haitiano e especialista em Constituição. Mas o Parlamento foi dissolvido. “Legalmente, ele não poderia fazer isso”, disse Michel.

“Estamos em total confusão”, disse Jacky Lumarque, reitor da Quisqueya Universty, uma grande universidade privada em Porto Príncipe. “Temos dois primeiros-ministros. Não podemos dizer qual é mais legítimo do que o outro.”

Nos últimos quatro anos, o país teve sete primeiros-ministros e estava prevista a substituição de Joseph esta semana após três meses no cargo. Na segunda-feira, o presidente havia anunciado que o novo premiê seria Ariel Henry, de 71 anos, que ajudou a liderar a resposta à pandemia. Mas, apesar de ser próximo da oposição, a indicação de Henry não foi bem recebida e os políticos e a população continuaram exigindo a renúncia do presidente.

O Conselho de Segurança da ONU realizará hoje uma reunião de emergência sobre o Haiti. O pedido foi feito pelos Estados Unidos, que também exortaram o país a realizar as eleições previstas para 26 de setembro.

“O primeiro-ministro fez questão de dissipar rumores de descontrole no governo. Segundo ele, está promovendo um diálogo com a oposição para ver como o país deve sair dessa crise. Ele me disse que pretende realizar normalmente o calendário das eleições, mas frisou que a maneira como vão se desenrolar depende de um diálogo com outras forças do país”, disse ao Estadão o embaixador do Brasil no Haiti, Marcelo Baumbach.

“Todo mundo está muito cauteloso, as embaixadas hoje (ontem) não abriram, as pessoas ficaram trancadas em casa. As ruas estão fechadas e há um policiamento forte, mas recebemos relatos de muitos tiroteios, incluindo na parte de Pétion-Ville, onde ficam as embaixadas”, acrescentou.

Crise política. O presidente enfrentava uma forte oposição de setores da sociedade que consideravam seu mandato ilegítimo. Moise, um empresário bem-sucedido no norte do país, de onde era originário, surgiu na cena política em 2017 com uma mensagem de reconstrução e fez campanha com promessas populistas.

Ele foi eleito em 2016, mas uma disputa sobre os resultados das eleições atrasou em um ano o início de seu mandato de cinco anos. Ele insistiu que o atraso lhe deu direito a permanecer no cargo por mais um ano. Seus oponentes discordaram e, em fevereiro, quando afirmavam que seu mandato tinha terminado, uma facção declarou o juiz da Suprema Corte Joseph Mécène Jean-Louis presidente interino. Moise condenou o movimento como uma tentativa de golpe e 23 opositores foram presos. A disputa provocou uma crise constitucional. Os confrontos entre gangues rivais e a polícia levaram à fuga de milhares de pessoas, segundo a ONU. (Com agências internacionais)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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