Confinados em um hotel, árbitros vivem a ‘bolha’ do Campeonato Paulista

Confinados em um hotel, sem poder ver parentes e submetidos com frequência aos testes contra a covid-19, os árbitros do Campeonato Paulista estão com uma rotina idêntica à dos jogadores. O isolamento social virou lei. Quem trabalha nas partidas das duas primeiras divisões do Estadual tem sido obrigado a permanecer em uma bolha e a criar novos hábitos para amenizar a distância da família e desempenhar atividades profissionais.

Para conseguir a autorização das autoridades para a retomada do torneio, há cerca de duas semanas, a Federação Paulista de Futebol (FPF) criou no protocolo o esquema de bolhas de segurança. Tanto jogadores como árbitros devem permanecer isolados em hotéis ou centros de treinamentos e só saírem de lá para participar das partidas. Os cuidados estão mantidos enquanto não houver uma flexibilização nas regras estaduais de combate à pandemia.

Embora não sejam as estrelas dos jogos, os árbitros estão sob as mesmas regras aplicadas para os atletas. Todos cumprem a mesma cartilha de cuidados. São testes PCR a cada três dias e mais o exame antígeno realizado horas antes do jogo para garantir que não houve contágio. Para aplicar o isolamento social, a FPF reservou um hotel na zona oeste de São Paulo para abrigar cerca de 70 membros dos quadros de arbitragem e mais alguns funcionários.

Os cuidados para a bolha dos árbitros foram preparados pelo diretor médico da FPF, Moisés Cohen. “Cada árbitro está isolado em um quarto. Eles almoçam e jantam em grupos de seis pessoas e com revezamento de turmas no refeitório, para que não tenha aglomeração. Todos os funcionários do hotel estão orientados para evitar o contato”, explicou ao Estadão. As despesas de hospedagem são bancadas pela FPF.

O esquema de cuidados faz com que os árbitros só tenham contatos mais frequentes com os respectivos assistentes do próprio trio fixo de trabalho. Em alguns horários, há no máximo a proximidade com mais um outro trio durante as refeições.

Além do quarto e do restaurante do hotel, os árbitros passam diariamente pela academia. Os equipamentos de musculação e a esteira são compromissos diários para manter o preparo físico em dia. Para frequentar o espaço, há uma norma rígida de revezamento. A determinação é que no máximo dois trios de arbitragem compartilhem o mesmo horário na academia. Ainda assim, sempre com a utilização de máscara e higienização das superfícies com álcool.

A FPF apenas detectou casos de contaminação por covid-19 em dois árbitros nos testes prévios ao início da bolha. Desde então, a rotina controlada e a obediência de quem precisa impor a disciplina dentro de campo têm sido fundamentais para evitar problemas.

Apesar do estilo sisudo dentro de campo, os árbitros têm relato a dificuldade de se afastar da família. A bolha de segurança teve início no dia 9. Caso não exista uma flexibilização das regras de combate à pandemia, a moradia no hotel só vai terminar em 23 de maio, data da final do Paulistão.

“A distância da família tem sido a parte mais difícil para todos. Eu tenho um filho que vai completar agora dois anos. É difícil lidar com isso. A família é apoio que a gente tem no dia a dia”, disse o árbitro Flávio Rodrigues de Souza, membro do quadro da Fifa e um dos principais nomes da FPF.

Quando não estão nos jogos, nos treinos ou na academia, os árbitros contam que passam as horas livres dentro dos quartos e entretidos em alguma tela. Alguns acompanham futebol pela televisão, estudam pelo laptop para se preparar para a próxima partida ou usam o celular para conversar com familiares. “A tecnologia nos beneficia para diminuir um pouco dessa saudade. Faço muita chamada de vídeo com o meu filho e minha esposa. Temos tentado minimizar essa ausência, até passar o momento em que vou poder voltar para casa”, explicou Flávio.

Para ajudar a passar o tempo, alguns até passam horas conversando com colegas que estão no mesmo hotel, mas que não podem encontrar presencialmente por causa das regras de distanciamento. Há também uma rotina de palestras e atividades para ajudar os 70 hóspedes a continuarem entretidos.

“Alguns árbitros estão aproveitando o tempo para trabalharem do hotel, como se fosse um esquema home office. Vários deles têm empreendimentos próprios e continuam se dedicando a isso. Eu vejo que há muita dedicação deles para manter a realização do torneio”, disse o diretor médico da FPF, Moisés Cohen.

CONTÁGIO – Apesar de não serem protagonistas do espetáculo, os árbitros têm apresentado uma taxa de contágio por covid-19 superior à dos jogadores no âmbito nacional. Segundo dados de um levantamento feito pela Associação Nacional de Árbitros de Futebol (Anaf), entre agosto de 2020 e fevereiro de 2021, as competições nacionais organizadas pela CBF registraram testes positivos para covid-19 em 35% dos árbitros. Nesse mesmo período, a taxa entre os atletas foi de 2%.

A Anaf não apresentou causas para o número de testes positivos. Uma das possíveis justificativas é que a contaminação tenha ocorrido fora do ambiente do futebol, durante as respectivas atividades profissionais. A entidade realizou o levantamento ao aplicar questionários para os mais de 700 filiados.

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