Crise no tribunal eleitoral do Peru impede a proclamação do novo presidente

A incerteza cresceu ainda mais nesta quinta-feira, 24, no Peru após um dos magistrados do Júri Nacional Eleitoral (JNE) anunciar que declinou de continuar no cargo, com o aparente objetivo de impedir o órgão de proclamar o esquerdista Pedro Castillo como vencedor do segundo turno das eleições presidenciais.

O movimento do juiz que avaliava os recursos com alegações de fraude apresentados pela candidata de direita Keiko Fujimori para evitar sua derrota deixou o organismo sem quórum e complicou o caminho para a aguardada proclamação dos resultados.

“Foi iniciada uma avaliação legal para que se permita tomar medidas imediatas para salvaguardar a democracia e evitar que se afete a conclusão do processo eleitoral após a declinação irrevogável apresentada pelo magistrado Luis Arce na noite de quarta-feira”, segundo anunciou o JNE.

Legalmente, o juiz não pode renunciar enquanto não finalizar o atual processo eleitoral, por isso ele utilizou a palavra “declinar” para não continuar com seu trabalho.

Um grupo de políticos conservadores pediu nesta quinta-feira ao presidente Francisco Sagasti que solicite à Organização dos Estados Americanos (OEA) para auditar a eleição apertada de 6 de junho. Castillo venceu Keiko por 44 mil votos de acordo com a contagem oficial, mas o JNE precisa decidir sobre os recursos apresentados pela candidata antes de proclamar um vencedor.

Na tentativa de desbloquear o impasse, o JNE solicitou ao Ministério Público a designação de um novo membro daquele órgão para evitar “afetar o ápice do processo eleitoral”.

O JNE optou por suspender o exercício do cargo a Arce e manifestou seu repúdio às expressões ofensivas constantes na sua carta de desistência, na qual afirma que tudo parecia estar consumado há muito tempo em favor de Castillo.

O juiz justificou ainda sua decisão dizendo que ela era uma ação para evitar que seus votos minoritários fossem usados para validar falsas deliberações constitucionais que, segundo ele, são decisões com claras tendências políticas.

A decisão de Arce parece estar em sintonia com setores políticos que insistem em denunciar o que chamam de fraude em detrimento de Keiko, embora os Estados Unidos e a OEA tenham afirmado que o processo eleitoral peruano foi limpo e justo.

Antes de proclamar o vencedor, o JNE estava fazendo um progresso lento na resolução de todas as solicitações e recursos apresentados por Keiko, e já havia negado a maioria deles. Luis Arce era o único dos quatro magistrados do JNE que até então havia apoiado a tese infundada de Keiko sobre uma suposta fraude.

A chefe do Judiciário, Elvia Barrios, pediu nesta quinta-feira uma solução pacífica para o novo obstáculo no processo de proclamação do novo presidente e alertou contra qualquer alternativa antidemocrática.

“O ‘declínio’ do magistrado Luis Arce constitui um ataque frontal ao Estado de Direito que visa colocar em risco a democracia”, tuitou José Miguel Vivanco, chefe da ONG Human Rights Watch para as Américas.

Na terça-feira, os Estados Unidos destacaram em nota do Departamento de Estado que as eleições peruanas são um modelo de democracia na região e afirmaram apoiar que as autoridades eleitorais tenham tempo para processar e publicar os resultados de acordo com a legislação peruana.

No entanto, o lado de Fujimori continua a afirmar que houve fraude e tem procurado bloquear – ou pelo menos atrasar – a proclamação do vencedor com vários pedidos ao JNE, enquanto militares reformados manifestam-se nas ruas e convocam as Forças Armadas para impedir que Castillo assuma o controle, a quem também chamam de comunista.

No Peru, a palavra comunista está associada ao terror causado pelo Sendero Luminoso da guerrilha maoísta (que operou entre 1980-2000), ideia que Keiko e seus apoiadores promoveram durante a campanha. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

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