‘O Sopro’, a primeira mostra do ator Luiz Damasceno

Em abril, o ator Luiz Damasceno completou 80 anos sem planejar um espetáculo e tampouco uma festa para os amigos íntimos. Isolado por causa da pandemia, no entanto, o artista gaúcho, radicado em São Paulo desde 1971, remodelou sua rotina sem qualquer ansiedade ou amargura. “Sou professor aposentado da Escola de Arte Dramática e o que ganhei com o teatro foi economizado anos a fio, então me dei ao luxo de aproveitar a segurança que conquistei”, conta ele. “Abri espaço para a realização de meus desejos e antigas frustrações, como aulas virtuais de canto e a pintura.”

Pela mesa da cozinha de seu apartamento, na Vila Buarque, tubos de tintas e pincéis dividem espaço com telas virgens de onde, aos poucos, personagens vem à tona depois de que uma mancha é lançada sobre o branco. Da mistura de cores, mulheres, animais e figuras oníricas ganham formas em uma manifestação até agora desconhecida do público. “Coloquei um freio na inspiração ou teria de me mudar de casa, porque não há mais espaço para tantos quadros”, exagera o pintor, que produziu mais de 70 obras em um ano e meio.

Batizada de O Sopro, a primeira exposição de Damasceno reúne 50 telas e, de forma virtual, entra no ar na sexta-feira, 24 de setembro, no site www.luizdamasceno.com e no Instagram @galerialuizdamasceno. Cada uma das obras estará à venda por valores entre R$ 2 mil e R$ 4 mil. Para marcar a abertura, às 20h, uma performance homônima, protagonizada pela atriz Louise Helène, será exibida no canal do YouTube de Giovani Tozi, responsável pela concepção e direção do projeto.

O talento de artista plástico de Damasceno não veio à tona no confinamento. É uma vocação antiga, desenvolvida na juventude, na época em que ele ainda morava em Porto Alegre, e deixada de lado por causa da dedicação aos palcos. “Sou apaixonado pelas obras de Fernando Botero e Marc Chagall, pelo flerte com o fantástico, não gosto de um realismo extremo”, afirma ele, descrevendo suas influências. “Sempre pintei, presenteava amigos, mas só em meio à pandemia fui capaz de acumular uma quantidade capaz de gerar uma exposição.”

O teatro não fica de fora da comemoração um pouco atrasada dos 80 anos. O mesmo Giovani Tozi, de 37 anos, escreveu, dirige e contracena com Damasceno em Só Ópera. A comédia será apresentada nesta sexta, 17, e sábado, 18, às 21h, e domingo, 19, às 19h, nas plataformas do Teatro João Caetano, em São Paulo, com ingressos gratuitos. Ambientada em um estúdio de rádio, Só Ópera traz um embate de gerações através de dois comunicadores. O veterano Luiz Pavarinni, profundo conhecedor do mundo da ópera, é obrigado a enfrentar as interferências do novato Enzo Valentim, filho do dono da emissora, que propõe mudanças na programação em nome da conquista de diferentes audiências. Um confronto cheio de discordâncias que parece não se repetir na vida real.

Damasceno e Tozi se conheceram no fim de 2008, nos ensaios do espetáculo O Colecionador de Crepúsculos, dirigido por Vladimir Capella, em que representavam pai e filho. “Em uma das cenas, eu tinha que falar, falar sem parar e o personagem do Damasceno me interrompia a certa altura, só que, um dia, ele parou de me cortar e entendi que, com sua vocação natural de mestre, estava me estimulando a improvisar e estabelecer um jogo”, relembra Tozi, que ainda trabalhou com o colega em Pergunte ao Tempo, Troilo e Créssida e Quiquiriqui.

Damasceno, por sua vez, retribui o elogio, sublinhando a disponibilidade e empreendedorismo do parceiro: “Ele tem uma rara habilidade de concretizar as próprias ideias e, dentro ou fora do palco, desenvolvemos uma escuta mútua, gostamos de conversar e aprendemos juntos”.

A capacidade de realização de Tozi será testada em um desafio ambicioso em relação a orçamentos e egos no próximo ano. O produtor pretende colocar de pé Estilhaçado, espetáculo que pode marcar o reencontro de Damasceno com o diretor Gerald Thomas depois de um afastamento de 15 anos e polêmicas pouco esclarecidas.

“Eu fui levado pela Clarisse Abujamra a participar de Carmen com Filtro, uma das primeiras direções do Gerald no Brasil, e, na sequência, fizemos A Metamorfose, da Trilogia Kafka”, recorda Damasceno, que foi um dos fundadores da Companhia de Ópera Seca, encabeçada por Thomas entre 1988 e 1997.

Ressabiado, o ator prefere, por enquanto, adotar um tom lacônico em relação ao possível trabalho. “Vamos ver…”, desconversa Damasceno, sobre aquela que, sim, seria uma grande comemoração para quem já aplaudiu as suas parcerias com Thomas até o começo dos anos 2000.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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