‘Um brasileiro nos pediu ajuda no Afeganistão’, diz embaixador

O Itamaraty tenta descobrir o paradeiro de um brasileiro que pediu assistência consular para sair do Afeganistão. A informação foi confirmada ao Estadão por Olyntho Vieira, embaixador do Brasil responsável pelo Paquistão, Afeganistão e Tajiquistão. Segundo ele, o homem – que ele prefere não identificar por segurança – indicou que vivia temporariamente no país. A seguir, trechos da conversa do embaixador com o jornal.

Qual a situação dos cidadãos brasileiros no Afeganistão?

Temos um caso que ainda não está claro. Um brasileiro que entrou em contato com o plantão consular, por mensagem de texto no telefone da embaixada. Mas não temos muita informação ainda, estamos tentando saber mais. O outro caso foi resolvido pela Argentina. Uma brasileira casada com um argentino que trabalhava numa ONG e já partiram, estão no Usbequistão. Houve uma movimentação diplomática, mas não sei dizer como eles saíram do Afeganistão. Os argentinos cuidaram de tudo.

Ainda não localizaram o cidadão desse primeiro caso?

Não. Houve uma troca de mensagens, pedimos mais informações, mas ele certamente está com dificuldade de comunicação. À medida que ele diga mais coisas, vamos tentando saber mais e, se chegar a esse momento, como faremos para retirá-lo do país.

O senhor poderia identificá-lo?

Eu prefiro não dizer. É melhor manter isso reservado.

Ele morava ou estava em trânsito no Afeganistão?

Entendi que ele está vivendo temporariamente no país. E é tudo, não temos mais informação do que isso.

O que lhe chamou mais a atenção no avanço militar do Taleban?

O que surpreendeu realmente muito foi a rapidez com que tudo aconteceu e o que levou a essa rapidez foi a ausência de resistência. Isso leva à pergunta: por que não houve resistência? Seria muito ingênuo dizer que as pessoas estavam todas cooptadas pelo movimento. Acho que não. Mas, por outro lado, talvez nunca estivessem totalmente convencidas da presença ocidental no país.

Um porta-voz do Taleban disse que a população sempre esteve com eles.

Faz sentido. Isso me remete a um comentário feito anos atrás pelo Sérgio Vieira de Mello (brasileiro e alto-comissário da ONU para os direitos humanos, morto em 2003 num atentado no Iraque) sobre a presença de tropas estrangeiras. Ele disse o seguinte: ‘Como você reagiria se, de repente, abrisse a janela pela manhã e visse tropas estrangeiras na avenida em Copacabana?’ Acho que é isso. A presença do invasor, ainda que você conviva com ele por vários motivos, inclusive pela vontade de permanecer vivo, nunca é totalmente assimilada.

Qual a situação da frota de aviões Super Tucano da Embraer que havia sido comprada pelos EUA para a Força Aérea afegã?

Eu sei pela imprensa que seriam um total de 26 aviões, mas parece que a maior parte teria ido para o Usbequistão. Um jornal local do Paquistão exibiu uma foto de um grupo do Taleban diante de um Super Tucano. Então, pelo menos um ficou no Afeganistão. Mas se desconhece o paradeiro dos demais. O que se especula é que o Taleban não tenha pilotos. Mesmo que tenham, são equipamentos extremamente sofisticados, e você pode inutilizá-los se a parte de aviônica deixar de funcionar. Eles teriam como pilotar? Teriam mísseis para equipar os aviões? Teriam acesso ao software para fazer o avião funcionar? São perguntas que ninguém é capaz de responder.

Há atividade do Taleban em território paquistanês?

Os paquistaneses estão muito atentos ao risco de o problema chegar aqui. Tem havido declarações do comandante do Exército, do presidente e do primeiro-ministro de que o pior cenário seria uma guerra civil, que pode involuntariamente envolver o Paquistão ou parte dele. Uma guerra civil num país vizinho fatalmente acaba contaminando o outro. Existe uma relação étnica importante entre as populações. Essa região tem uma cultura tribal forte, existem diferentes etnias dentro do Paquistão e uma delas é a pashtun, que compõe cerca de 20% da população e é predominante no Afeganistão.

Há risco de uma crise de refugiados?

Existe uma preocupação com refugiados. O Paquistão abriga 1,4 milhão de refugiados afegãos. Mas especula-se que seja um número maior. O primeiro-ministro paquistanês já teve conversas com o presidente do Irã, porque eles construíram campos ao longo da fronteira para abrigar refugiados. Comenta-se que talvez o Paquistão faça algo semelhante.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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