Violência volta à Irlanda do Norte em atos pós-Brexit
Os governos inglês, irlandês e norte-irlandês condenaram ontem a onda de violência. Para tentar conter a situação, o Parlamento regional da Irlanda do Norte foi convocado para uma reunião de emergência.
Os protestos começaram na semana passada na cidade de Londonderry, de 100 mil habitantes, antes de se espalharem para Belfast, no fim de semana de Páscoa. O início das tensões é simbólico. Londonderry fica na Irlanda do Norte, na fronteira com a República da Irlanda. Por 30 anos, a região ficou marcada pela violência sectária, entre protestantes e católicos, que deixou cerca de 3,5 mil mortos.
O atrito não é novo e precede a independência da Irlanda, em 1922, mas se agravou nos anos 60, quando os unionistas protestantes formaram milícias paramilitares para conter a ameaça que representava o Exército Republicano Irlandês (IRA), que defendia os católicos e lutava pela unificação da Irlanda.
A tensão foi se dissipando com o tempo em razão da integração econômica levada pela União Europeia, especialmente após o fim gradual da fronteira, a partir de 1992 – incluindo o desmantelamento dos postos de controle britânicos, considerados um símbolo da presença do Reino Unido na ilha. Finalmente, o Acordo da Sexta-Feira Santa, de 1998, encerrou o conflito.
Com o Brexit, a possibilidade de reconstruir a fronteira física, que ameaçava reviver a violência, levou o governo do Reino Unido – com os premiês Theresa May e Boris Johnson – a aceitar que a Irlanda do Norte permanecesse no mercado comum europeu. Na teoria, o território continuava como parte do Reino Unido. Mas, na prática, foi criada uma fronteira entre as ilhas irlandesa e britânica.
Os unionistas consideraram o acordo uma “traição”. E os nacionalistas enxergaram nele uma possibilidade de finalmente unificar a Irlanda. Em 2013, antes do Brexit, pesquisas indicavam que mais de 60% dos norte-irlandeses eram contra a reunificação – cerca de 25% eram a favor. Em janeiro, uma sondagem do Sunday Times mostrou que a maioria ainda é a favor da união com o Reino Unido, mas a diferença evaporou (47% a 42%, com 11% de indecisos).
Autoridades em Londres, Belfast e Dublin concordam que a violência dos últimos dias é preocupante. Boris Johnson afirmou no Twitter que está “profundamente preocupado”. “A forma de resolver as diferenças é o diálogo, não a violência ou a criminalidade”, escreveu.
Ele telefonou ontem para o primeiro-ministro irlandês, Micheal Martin, e os dois pediram calma e consideraram a violência inaceitável. “A única maneira de avançar é abordar as questões que preocupam através de meios pacíficos e democráticos”, disse Martin. “Agora é o momento de os dois governos trabalharem juntos para reduzir as tensões e restabelecer a calma.”
Culpados
“Não há dúvida de que o Brexit e a introdução de controles alfandegários prejudicaram significativamente o equilíbrio de forças na região”, afirmou Duncan Morrow, professor de ciência política da Universidade do Ulster.
No entanto, o Brexit é apenas um aspecto de uma crise maior entre os unionistas da Irlanda do Norte. Em 2017, eles perderam sua maioria histórica no Parlamento regional. Dois anos depois, pela primeira vez, os norte-irlandeses elegeram mais nacionalistas do que unionistas para o Parlamento britânico.
Isso contribui para uma mudança demográfica, da geração mais jovem caminhando em direção ao nacionalismo, fazendo com que os unionistas se sentissem uma minoria sitiada. “Os unionistas sentiram que o lugar da Irlanda do Norte dentro do Reino Unido está ameaçado. E eles se sentem traídos por Londres”, disse Katy Hayward, professora de política da Queen’s University, de Belfast. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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