Audiência alerta para aumento de mortes e doenças relacionadas às mudanças climáticas
Um quarto de todas as doenças e mortes que ocorre no mundo atualmente pode ser atribuído aos fatores ambientais. O preocupante dado da Organização Mundial da Saúde (OMS) foi apenas um dos alertas trazidos por especialistas à Assembleia Legislativa do Paraná, durante a Audiência Pública que tratou sobre os impactos das mudanças climáticas no sistema de saúde.
O encontro no Plenarinho foi promovido pela deputada Márcia Huçulak (PSD), como uma forma de aproximar o Legislativo do tema, alertar a sociedade e também discutir medidas para minimizar a situação. “Nós estamos sempre buscando resolver as consequências dos atos. Mas precisamos focar um pouco em evitar a causa desses efeitos deletérios que comprometem muito a saúde humana. Pois os maiores impactos das mudanças climáticas estão na saúde”, afirmou.
Ela usou como exemplo a atual epidemia de dengue, que chegou a 159.357 casos confirmados e 77 mortes no Paraná, de acordo com o último boletim epidemiológico. “Está em cidades do nosso estado e do Brasil que nunca tiveram. Curitiba é um caso. Raramente tínhamos casos autóctones (contraídos na própria região), a última vez foi em 2016. Agora vemos esse crescimento expressivo que tem a ver com o aumento da temperatura no planeta, com a multiplicação de patógenos. O ambiente quente e úmido propicia aumento de transmissão causando danos à saúde humana”, acrescentou.
E essa relação entre epidemias e ambientes urbanos foi abordada pelo diretor do Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, Alcides Augusto Souto de Oliveira. “À medida que o mundo aquece, a saúde humana está na linha de frente. Segundo a OMS, um quarto de todas as doenças e mortes que ocorre no mundo atualmente pode ser atribuído aos fatores ambientas. Por isso o calor extremo é um problema de saúde claro e crescente, sendo urgentemente necessários planos de adaptação baseados em evidências para evitar mortes desnecessárias”.
O professor e pesquisador na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e membro da Associação Brasileira de Climatologia (ABCLIMA) Flavio Feltrim Roseghini falou do conceito One Helth, ou Saúde Única, que considera três esferas distintas: saúde humana, animal e ambiental, diretamente ligadas ao clima.
“A gente chama o clima de condicionante ambiental e a mudança climática tem um impacto muito grande como vimos mais recentemente com o este forte El Niño: aumentando a temperatura, com mais chuvas e invernos menos frios. Em relação à dengue, por exemplo, são condições favoráveis para a explosão dos casos como estamos vendo”, disse.
Questões sociais como a falta de saneamento, de ações da sociedade e a carência de políticas públicas contribuem para este panorama. “As mudanças climáticas são democráticas e vão atingir a todos, mas as populações mais vulneráveis sofrerão mais”.
O professor titular e vice-chefe do Departamento de Zoologia UFPR, Mario Antônio Navarro da Silva definiu o Aedes aegypti como uma máquina biológica extremamente inteligente para encontrar o ser humano. “E as mudanças climáticas transformam o cenário atual em um paraíso para mosquito, imprimindo uma velocidade muito alta para o seu desenvolvimento”.
A necessidade de médicos veterinários e agentes de saúde trabalharem juntos foi ressaltada pelo representante do Conselho Regional de Medicina Veterinária, Antônio Felipe Figueiredo Wouk. Ele apontou que 75% das doenças emergentes que afetam o ser humano têm origem nos animais. “Nosso exemplo mais próximo e que tem muito a nos ensinar, é a própria Covid. A detecção precoce favorece e racionaliza muitos os cuidados com a saúde. Quanto mais precocemente isso for diagnosticado nos vetores, nos animais, antes de chegar ao ser humano, mais fácil minimizar os custos com a saúde.
Diretor-geral do Complexo Pequeno Príncipe e militante ambiental há muito anos, José Álvaro Carneiro foi fundador da Associação Pró-Jureia, SOS Mata Atlântica, Liga Ambiental e Mar Brasil, e considera que as perspectivas atuais em relação às mudanças climáticas não são boas.
“Vivemos em 2023 o ano mais quente da história e todos já sofremos eventos globais extremos, como calor e chuvas. A sociedade não está cumprindo o Acordo de Paris, temos cenários políticos imprevisíveis pela frente, como as eleições nos Estados Unidos, as guerras em curso e a concentração de riquezas”, citou.
Ele expôs ações que colocam o Complexo Pequeno Principe como uma das instituições filantrópicas de saúde na vanguarda mundial de práticas ambientais. Entre elas, o foco na redução do consumo de energia, água e geração de resíduos, compostagem, reciclagem de tecidos e neutralidade na emissão de gás carbônico. “Consideramos que o setor privado tem de assumir a responsabilidade nestas práticas, assim como estamos fazendo há muitos anos.”
A secretária municipal de Saúde de Curitiba, Beatriz Batistela Nadas, considera que viver hoje em cidades é um desafio grande. “Somos consequência do aquecimento global e vemos no dia a dia todo esse impacto, com doenças antigas e novas, nos atendimentos, nas UTI’s”.
Após as explanações, transmitidas ao vivo pela Tv Assembleia, a deputada Márcia Huçulak reforçou a importância da abordagem em relação à Saúde Única e também da discussão sobre a concessão de isenções e benefícios fiscais às empresas que contribuem com a proteção ambiental.
“Importante ampliar a discussão. E este ano vamos escolher os gestores das cidades nas eleições. Convoco a todos que coloquem essa pauta em seus planos de governo para ações neste sentido”, sugeriu.