Seja bem-vindo ao fim do mundo
Uma madrugada dessas acordei sobressaltado de um pesadelo (como muitos de nós têm relatado neste período de pandemia, eu também estou sofrendo de sonhos bizarros e perturbadores). Era pouco mais de 3h30 da manhã. O cachorro roncava na cama e, neste momento perdido entre o susto, o sono e o alerta, eu tive um insight: nós estamos vivendo o fim do mundo!
Calma. Não tem nada a ver com o que vimos no cinema. Não tem meteoro nem Bruce Willis pra nos salvar, o céu não está caindo, não tem alienígena explodindo a casa branca. Não tem terremotos e erupções vulcânicas devastando a Terra. Não tem zumbi (pelo menos ainda). Mas tem um vírus mortal que não, não vai exterminar 95% da população, porém já mudou tudo.
Aconteceu que o fim do mundo não veio como esperávamos. Mas é fato que ele veio. Olhe para janeiro ou fevereiro de 2020 e se pergunte: a vida continua a mesma?
Como diz a música do grupo REM “é o fim do mundo como o conhecemos”. Este mundo como nós conhecíamos acabou em março de 2020. Profissões foram extintas e inventadas, hábitos modificados, o capitalismo mais questionado do que nunca, a natureza retomando seu lugar em diversos países… é, tudo mudou.
Ninguém garante que os testes com as vacinas contra o coronavírus funcionarão, todos esperamos que sim. Mas todo fã de cinema sabe o que acontece com uma vacina que fracassa…
Ao contrário do que acontece nos filmes, no entanto, antes de atingirmos um ponto catastrófico nós fomos presenteados com uma nova chance. Aqueles que sobreviverem terão a oportunidade de construir um novo mundo. Como muitos têm dito “não vamos voltar ao normal porque o normal não estava bom”. Já estamos aprendendo a conviver com o novo normal. E isso é ótimo. Indústrias bilionárias foram obrigadas a rever seus conceitos de lucro, o consumidor não quer apenas mais uma marca, quer saber o que ela faz para ajudar a situação. Gente trabalhando de graça ajudando quem não pode, artistas tocando de casa, a gente revendo nossos hábitos de consumo desenfreado, serviços de streaming ganhando força, drive-ins ressurgindo… estamos testemunhando o nascimento de um admirável mundo novo (Aldous Huxley que me desculpe) que não sabe se está no passado ou no futuro. Nossa superexposição e nossa dependência da tecnologia nunca foram tão grandes. Mas nosso medo de sair de casa e do que vai acontecer amanhã também não.
É como se estivéssemos num fliperama e chegamos no game over. Temos a chance de colocar outra ficha e recomeçar o jogo. Cabe a nós decidirmos se vamos jogar da mesma forma ou não. De qualquer maneira, esperamos que a humanidade não repita os mesmos erros e comece um novo jogo, que possamos construir um novo mundo de fato.
E que possamos dizer aos nossos netos “eu testemunhei o fim do mundo. E ajudei no seu recomeço”.
Flávio Jayme é pedagogo, jornalista cultural e produtor de conteúdo digital em Curitiba