De volta pra casa

O descobridor dos mares preparou seu barco para a maior aventura de sua existência: buscar novas terras no mundo ainda inexplorado. Era o desafio a que se propunha um navegador inglês do século XVIII. Para esse fim, comprou mantimentos para um longo período de viagem em alto mar; revisou os equipamentos necessários para o empreendimento; inspecionou cuidadosamente as velas; preveniu-se com material de reposição para itens que pudessem sofrer avarias; e, finalmente, carregou muitas armas para enfrentar o desconhecido. A viagem começou com toda a expectativa, pois a curiosidade o estimulava, a coragem o impulsionava e a confiança o movia. As emoções se sucediam variando de um extremo a outro, porém ele estava preparado para o desafio. Assim, após várias semanas de navegação, de repente, na linha do horizonte o navegador vê algo diferente. Não era a bruma marítima que, por vezes, cria uma ilusão de ótica, era uma elevação terrestre. Ficou extremamente feliz e ansioso com a possibilidade de ser o descobridor de novas terras. Avançou com o seu barco, navegou próximo à costa e observava aquele pedaço de um mundo novo que nunca antes alguém do seu país havia visto. Ao longe avistou uma construção com contornos exóticos que confirmava a sua busca por novas terras. Atracou o barco e, logo, aproximaram-se algumas pessoas com um aspecto raro. Ele estava fortemente armado, além de estar protegido pela armadura e o capacete. Carregado de tensão e medo, fez uma saudação com sinais para começar uma interlocução com os supostos nativos. Surpreendentemente eles o saudaram:

– Bom dia! De onde o senhor vem?

Ficou espantado ao ouvir a resposta em sua língua nativa, o que lhe gerou uma série de sentimentos controversos. Por um lado, sentiu-se triste, incomodado e frustrado ao perceber que não havia descoberto nada novo, porque seguia na Inglaterra. Por outro lado, sentiu-se alegre, acolhido e seguro ao constatar que havia atracado em casa.

Trata-se da proposta de um romance que Chesterton (1874-1936) nunca chegou a escrever, porém nos permite uma série de paralelos com nossa vida em suas diferentes esferas. O que acontece quando saímos e voltamos para casa no nosso dia a dia? E na nossa vida? Creio que acontece um movimento rítmico, constante e permanente desde as situações cotidianas até o final da jornada de aventura e regresso.

Por exemplo, quando vamos de casa para o trabalho acontece um processo semelhante, assim como ao interagir com alguém que conheço ou com alguém que ainda me falta conhecer há o conhecido e o desconhecido. Igualmente acontece ao frequentar ambientes sociais diferentes e novos; ao se conhecer as pessoas do seu ambiente familiar; e, finalmente, ao se reconhecer como responsável desse vaivém, apropriando-se da curiosidade que estimula, da coragem que impulsiona e da confiança que nos move para buscar os novos mundos e nele reencontrar a sua própria casa.

Nesse movimento de um ambiente a outro podemos passar pela tristeza e pela alegria; pela incomodidade e pela acolhida; e pela frustração e pela segurança, porém é nesse ir e vir entre a casa e a aventura que se vencem os desafios. Esse processo pode acontecer no trabalho, nas interações sociais, nas relações pessoais e na jornada da vida.

Enfim, Chesterton nos faz um convite para que busquemos novos horizontes em cada relação, situação, trabalho e interação, mas principalmente na relação consigo mesmo e com a vida. Para esse fim, é importante ter os mantimentos e os equipamentos para cada empreendimento do qual se participa, assim como inspecionar e prevenir-se num movimento constante de curiosidade alegre, de coragem acolhedora e de confiança segura que se fundamenta no respeito. A abertura para aprendizagem é uma regra. Desse modo, a vida será uma aventura em que não necessitamos mais levar as armas, apenas os recursos internos que vão nos garantir a sensação de que se está numa aventura rumo a nossa verdadeira casa, porque um dia a ela retornaremos.

Moacir Rauber

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