O cantinho da calma

0 6

Estava numa reunião pedagógica de professores de uma escola municipal que atende alunos do Ensino Fundamental, onde os professores compartilhavam as experiências nos diferentes momentos de interação com os alunos e entre si mesmos. Um professor comentou sobre um dos alunos de treze anos, que, por vezes, se punha agitado, nervoso e agressivo, descontrolando-se. Numa das ocasiões em que se descontrolou, o professor pediu para que o aluno fosse falar com a supervisora da escola. Nesse momento, a supervisora lembrou do caso e disse que o menino chegou na sala e teve que esperar, porque ela estava em outro atendimento. Na sequência, ela o recebeu sem saber a razão da presença dele:

– Bom dia, como você está? Do que se trata?

Foi uma saudação aberta, carinhosa e acolhedora que desarmou os últimos sinais de agitação, nervosismo e agressividade do menino. O que aconteceu durante o tempo que ele esteve na sala de espera? O menino, ainda que involuntariamente, fez uma pausa. Não se tratava do “cantinho do pensamento”, prática usada que pode representar a punição ou o castigo por algo feito, mas de um momento de tomada de consciência sobre o ocorrido. No período em que o menino esteve só na sala de espera ele teve tempo para se acalmar e repensar a situação, talvez descobrindo que as pessoas não estão umas contra as outras, mas umas para as outras, especialmente os professores. E nós, no nosso dia a dia, fazemos uma pausa? Provavelmente muitos de nós não conseguimos um tempo para uma pausa, seja ela no início da manhã para direcionar as atividades do dia ou durante o dia nas interações com outras pessoas. Sem a pausa, por vezes, as pessoas se tornam agressivas. O trânsito é um exemplo clássico onde as pessoas demonstram irritação frequentemente, colocando-se os motoristas uns contra os outros na disputa pelo espaço. Os motoristas se esquecem que estão nas ruas em direções diferentes, mas com o objetivo comum se deslocar de um lado a outro. Não deveriam estar uns contra os outros. Nas empresas ocorre um fenômeno parecido em que pessoas e departamentos se colocam em pé de guerra como se não estivessem na organização para cumprir com a mesma missão, apenas com atividades diferentes. Não há inimigos na organização. Nas cidades, nos países e na sociedade a lógica se repete porque não estamos uns contra os outros, seja entre Rio e São Paulo, entre Brasil e Argentina ou entre ateus e crentes ou qualquer outra classificação que pode representar uma divisão. Não temos inimigos naturais representados pelos predadores. Temos um único inimigo interno que não permite ver que o outro tem as mesmas necessidades e buscas que um mesmo, apenas com atividades diferentes e que escolhe outras estratégias para chegar aonde pretende chegar.

Como terminou a conversa com o aluno? Ao ser indagado pelo motivo da sua presença na sala da supervisora o aluno titubeou um pouco, porém, em seguida foi autêntico, exibindo humildade, coragem e confiança para dizer que se comportou inadequadamente. A autenticidade de reconhecer a inadequação do seu comportamento requer a humildade de quem tem a coragem para admitir a própria responsabilidade num momento de descontrole. Ficam as reflexões:  a situação não se desenvolveu como eu quis? O que fazer? Reclamar, maltratar ou agredir resolve? Provavelmente não. Fazer uma pausa pode ajudar a recuperar a consciência e a tranquilidade para atuar sobre aquilo que está no meu controle, porque o outro não é mais o meu predador nem o meu inimigo. Nas escolas, nas organizações, nas cidades e no mundo nós estamos com as pessoas, para as pessoas e pelas pessoas, porque sem elas nós não temos razão de existir. O meu inimigo não está do lado de fora, ele está dentro de mim e a pausa pode fazer com que o reconheça para me comportar de maneira a que eu não perca para mim mesmo.

O menino de treze anos encontrou um “cantinho da calma” para entender isso. E você, consegue?

Moacir Rauber

Instagram: @mjrauber

Blog: www.facetas.com.br

E-mail: [email protected] Home: www.olhemaisumavez.com.br

Deixe um comentário