Preparar-se para o futuro? Não dá…

Uma moça da fazenda carregava um balde de leite na cabeça e sonhava que com ele poderia fazer nata. Da nata faria manteiga. Com o dinheiro da venda da manteiga compraria ovos dos quais nasceriam pintinhos. Depois de crescidos os venderia e se compraria um vestido para usar na festa da comunidade. Imaginava que o filho do moleiro iria querer dançar com ela ao vê-la tão bonita. Mas ela não aceitaria imediatamente. Primeiro, diria que ‘não’ e com a cabeça e ensaiou o gesto. Ao menear a cabeça o balde de leite caiu. A moça estava desolada, porque ficou sem nada: sem vestido, sem pintinhos, sem ovos, sem manteiga, sem nata e, acima de tudo, sem o leite que a levou a sonhar. O que nos ensina essa fábula de Esopo?

Durante muito tempo, mantivemos o foco na preparação de pessoas para o futuro, embora eu acredite que o foco deveria ser na preparação para o presente.  A fábula ilustra isso e a conjuntura econômica e social atual confirma, porque mais do que nunca não estamos no presente. Ora estamos no passado. Ora estamos no futuro. Assim, muitas pessoas se refugiam em alegrias vividas em supostos dias melhores, o passado, enquanto outras criam problemas que não existem, no futuro. Assim, permanentemente meneiam a cabeça e derrubam o leite. Percebe-se um contingente enorme de pessoas com a constante sensação de inadequação e de incompetência, resultado da impressão de nunca se estar onde se deveria estar e de nunca saber tanto quanto se deveria saber. E é verdade. Vive-se um tempo de pessoas ausentes, porque dificilmente elas estão no presente. O que fazer? Como mudar o foco? Pela educação, ao ensinar e aprender para o presente.

Até o momento, em tempos de Revolução Industrial 1, 2, 3 e 4, a preocupação era ensinar às pessoas um conjunto de habilidades técnicas que as manteriam empregadas até a aposentadoria. O foco estava em preparar as pessoas para serem melhores umas comparadas com as outras. Isso não serve mais. Entendo que avançamos para uma sociedade em que as coisas devem fazer sentido. As habilidades técnicas são importantes, porém elas se tornam obsoletas num piscar de olhos, assim como o presente se torna passado e o futuro se converte no presente. Estar no futuro ou no passado é o leite derramado no chão. Portanto, o que aprender e o que ensinar? Falamos das competências socioemocionais, em que o foco passa a ser o desenvolvimento pessoal para que cada um seja o melhor que pode ser no presente. Ganham destaque os estudos de inteligência emocional e seus pilares; a psicologia positiva com as suas fortalezas; a neurociência com as suas constatações; a mentalidade flexível e suas alternativas, entre outras abordagens e pesquisas científicas, usadas para resgatar a importância das competências socioemocionais. São elas que nos permitem viver bem no único tempo que temos: o presente. Assim, é importante ensinar as habilidades técnicas, que são passageiras, entretanto, é indispensável ensinar as competências socioemocionais, que são permanentes. Destaque para o despertar da unidade individual que permite o entendimento sistêmico do coletivo que manterá as pessoas aptas para viver no presente sem derrubar o leite.

Por isso pergunto: o que você faz faz sentido? O que você ensina com aquilo que você faz? O que você aprende com aquilo que você vê? A ideia de se manter estudando durante a vida é inteligente e sustentável, desde que aquilo que se ensina com aquilo que se faz e aquilo que se aprende com aquilo que se vê faça sentido no presente. E isso se fundamenta em valores humanos, como liberdade, justiça, honestidade e solidariedade, além de comportamentos que os expressem num movimento de cuidado para consigo e para com o outro. Desse modo, é necessário a flexibilidade mental para atualizar as habilidades técnicas constantemente, mas lembrando que são as competências socioemocionais que o manterão no presente, com a sensação de adequação e de competência.

Assim, preparar-se para o futuro não dá, porque devemos estar aptos para viver no presente, a única realidade que temos.

Moacir Rauber

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