Se todos vivessem como eu 2?

A conversa no café girava em torno das dificuldades econômicas e sociais do nosso país, principalmente como reflexo da conduta e do comportamento dos políticos nas diferentes esferas de influência. Era unanimidade que os vereadores, os deputados e os senadores, assim como os prefeitos, governadores e o presidente não representavam autenticamente os interesses dos eleitores. Inclusive, constatava-se que o poder judiciário se preocupava mais em politizar as situações do que em resolver em conformidade com a lei. Portanto, um dos integrantes da conversa ratificou: o problema de nosso país é a corrupção. Na sequência o tema mudou para a questão da comunicação e do entretenimento, admirando-nos com a profusão de recursos e serviços tecnológicos disponíveis, dificultando cada vez mais a escolha. Isso porque cada plataforma tem a sua forma de distribuição e de adesão. Desse modo, são tantas as ofertas que se você comprar ou assinar todos os serviços não há como pagar nem consumir. Nesse momento, um dos integrantes do grupo compartilhou:

– Ahh, eu comprei um aparelhinho que me abre todos os canais sem pagar nada. Paguei uma vez e está tudo disponível…

A fala foi feita com orgulho, demonstrando que se sentia mais esperto do que aqueles que pagavam mensalmente pelos serviços consumidos. O comentário, aparentemente inofensivo, confirma que o problema de nosso país é a corrupção. Trata-se de corrupção endêmica e transversal à população, confirmando que os políticos e aqueles que ocupam as altas esferas do poder não são nem mais nem menos corruptos do que nós, cidadãos comuns. Eles apenas têm acesso a outros tipos de oportunidades de serem corruptos. Por isso a pergunta: como seria o mundo se todos vivessem como vivia o meu amigo que rouba o sinal de TV?

Talvez possa parecer um crime menor roubar o sinal das TVs a cabo sob a justificativa de que o serviço é muito caro, porém se alguém não o pode comprar nada justifica roubar. Se eu não posso comprar uma TV de 50 polegadas isso não me dá o direito de roubá-la. Comparativamente às críticas feitas aos políticos e aos magistrados de que, muitas vezes, são corruptos, a ação de quem rouba o sinal é corrupção. Pode-se estender a pergunta para outras áreas: e se todos fizessem gato da energia elétrica? Para mim, esses atos de corrupção, que podem parecer pequenos, menores ou não prejudiciais, representam um problema endêmico da falta de valores e princípios de nossa sociedade em que fomos nos corrompendo gradativamente. Isso tende a nos levar a que ninguém mais pague os impostos ou a que ninguém respeite a casa do vizinho. Enfim, não se trata do tamanho do crime, porque é essencial entender que desviar recursos públicos ou roubar o sinal da TV a cabo é crime.

Nesse momento, fiquei triste, porque constatava que seria difícil sair da situação em que nos encontramos como país e como sociedade, porque são os pequenos roubos que fazemos que nos mantêm reféns do eterno país do futuro. A corrupção está no atestado falso, no uso inadequado dos recursos da empresa, no recebimento de benefício indevido e assim por diante. Da mesma forma, às vezes, parece-me pouco grave começar a aula cinco ou dez minutos mais tarde, porém, me pergunto: e se todos começassem suas atividades cinco minutos mais tarde? Outras vezes, parece-me pouco grave prestar um serviço e não emitir nota fiscal, contudo, outra vez me pergunto: e se ninguém emitisse nota fiscal? São essas pequenas corrupções que impedem que avancemos. Há que se destacar: ninguém está livre do pecado.

Por fim, ao final da conversa, paguei dezoito reais pelo café e um pão de queijo com uma nota de cinquenta pensando que era de vinte. A moça do caixa me alertou e deu o troco certo. E se todos nós nos comportássemos como a moça do caixa?

Ainda há esperanças!!!

Moacir Rauber

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