Com vestibular próprio, Paraná incentiva o ingresso de povos indígenas no ensino superior
Celebrar a cultura e herança indígena, esse é o objetivo do Dia dos Povos Indígenas, comemorado nesta quarta-feira (19). Para garantir que os indígenas tenham educação, renda e apoio, o Governo do Paraná conta com políticas públicas voltadas a essas comunidades e entre elas está o Vestibular dos Povos Indígenas. Trata-se de uma iniciativa pioneira que proporciona aos estudantes oriundos de etnias, comunidades e territórios indígenas o acesso ao ensino superior.
Anualmente, são ofertadas 52 vagas para cursos de graduação nas sete universidades estaduais do Paraná e na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Desde a criação da iniciativa em 2001, 195 alunos já concluíram cursos de graduação. Uma das primeiras alunas a se formar foi Rosangela Gonçalves, com o nome indígena Gár Fej, que significa flor de milho. Ela é da etnia Kaingang, da Terra Indígena Mangueirinha, no Sudoeste do Paraná, e prestou o vestibular em 2002 para o curso de Pedagogia na Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro).
A timidez foi um dos obstáculos que Rosangela superou para se adaptar à universidade. A pretensão de ter uma graduação e melhores oportunidades de emprego foi essencial para ela concluir o curso em 2005 e realizar o sonho de infância de ser professora. Desde 2006 ela exerce a profissão na rede municipal de Mangueirinha.
“Foi através da universidade pública que consegui realizar meu sonho e alcançar meus objetivos de hoje ser uma indígena independente. O que me motivou a ser pedagoga foi o desejo de transmitir conhecimentos sistematizados às futuras gerações da minha aldeia. Dar o exemplo de que somos indígenas, e devemos preservar todos os nossos valores culturais”, afirma Rosangela.
MATRICULADOS – Dentre os 295 indígenas matriculados nos cursos de graduação por meio do Vestibular dos Povos Indígenas, está Elizandra Mazieli Gyre Pereira. Ela cursa o 4° ano de Odontologia na Universidade Estadual de Maringá (UEM).
“Não importa quem é você, de onde vem e nem a cor da sua pele, pois com esforço e dedicação você pode ser o que quiser. Seja médico, advogado, dentista ou atuar em outras profissões. Sou grata por estudar na UEM onde fui bem acolhida, diferente de outros espaços que excluem os indígenas porque não reconhecem o valor da nossa cultura”, reforça a estudante.
Os indígenas também conquistam espaços fora do Brasil, como foi o caso do Rodrigo Portella, da etnia Guaraní Ñhandewa. Ele prestou o vestibular em 2007 na Universidade Federal do Paraná, e precisou suspender a graduação porque teve a oportunidade de estudar música na Europa (Holanda). Após três anos morando no Exterior, retornou ao país e começou a trabalhar em uma orquestra sinfônica. Em 2022 prestou o vestibular novamente para Licenciatura em Música na Universidade Estadual do Paraná (Unespar), para concluir o curso.
“O ensino superior é fundamental para os povos originários, os indígenas também são capazes de alcançar seus objetivos. A educação prepara e expande o conhecimento principalmente para as novas gerações que nasceram em um mundo tecnológico”, ressalta.
Filho de mãe indígena e pai não indígena, ele nasceu na Terra Indígena Laranjinha, no Norte Pioneiro, onde viveu até os 12 anos de idade. Rodrigo é violinista, assim como o pai que incentivou o filho para atuar na área da música.
PROGRESSO/SUCESSÃO – Além da graduação, os indígenas também procuram dar continuidade aos estudos, como é o caso de Irismar dos Santos. Ela é da etnia Guarani e nasceu na Terra Indígena São Jerônimo da Serra, na região Norte do Estado.
Há 10 anos atua na área da educação, fez magistério indígena, concluiu o curso de Pedagogia pela UEM em 2020 e concluiu a especialização em Gestão Escolar Indígena. Atualmente, cursa o mestrado vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação na UEM e planeja dar sequência aos estudos no doutorado.
Irismar acredita que a educação é um caminho importante para o fortalecimento dos povos indígenas. “Para nós indígenas, concluir uma graduação fortalece a nossa identidade e é uma forma de resistência contra o preconceito, assim podemos assumir a nossa própria educação, nas universidades, atuando como professor universitário. A universidade também é o nosso território, é o local onde adquirimos conhecimentos para defender os nossos direitos”, afirmou.
Atualmente ela trabalha como educadora social em uma associação indigenista em Maringá que auxilia 60 famílias da etnia Kaingang da Terra Indígena Ivaí, próxima ao município de Manoel Ribas, no Centro do Paraná. Irismar desenvolve atividades pedagógicas com cerca de 20 crianças. A aptidão para trabalhar com educação indígena também foi passada para o filho Jean de 22 anos que, assim como a mãe, ingressou na UEM para cursar Pedagogia e dar continuidade ao trabalho de ensinar as crianças indígenas.
INCENTIVO – A Comissão Universidade para os Povos Indígena (Cuia) é a entidade responsável por acompanhar pedagogicamente e garantir a permanência dos alunos nas universidades. A comissão é formada por representantes da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti) e das oito universidades.
“Nas universidades, os estudantes indígenas estão longe de casa e inseridos em uma cultura diferente e por isso precisam de apoio e incentivo para ingressar e continuar no ensino superior”, como explica Sandra Cristina Ferreira, assessora da Coordenadoria de Ensino Superior, Pesquisa e Extensão da Seti e representante da instituição na Cuia.
Da AEN