Hanseníase: quando a desinformação leva ao preconceito

Durante todo o mês de janeiro, a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) coloca em práticas ações voltadas a campanha Janeiro Roxo, com o intuito de conscientizar a população contra o estigma e o preconceito vinculados à hanseníase. O Dia Mundial de Combate e Prevenção da Hanseníase é comemorado no último domingo de janeiro.

De acordo com o presidente da SBD, Heitor Gonçalves, a iniciativa destina-se ainda às autoridades públicas, no sentido de chamar a atenção para a necessidade de mais investimentos para o controle da hanseníase, aos profissionais de saúde, para reacender a discussão técnica e política sobre a problemática da hanseníase e à imprensa, para que tome conhecimento e seja aliada da campanha.

O nome da campanha, segundo Gonçalves, decorre do fato de a cor roxa sinalizar a criatividade e o aprofundamento sobre o estudo das questões “e, principalmente, a luta contra uma causa sem amarras e sem preconceitos. Daí o lema Janeiro Roxo, um mês de combate ao preconceito contra a hanseníase”.

QUADRO PREOCUPANTE – A Sociedade Brasileira de Dermatologia considera preocupante o quadro da hanseníase no Brasil. Segundo o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde sobre hanseníase, em 2019, antes da pandemia de covid-19, foram notificados 27.864 novos casos no país, o equivalente a 93% de todos os registros da região das Américas e a 13,7% dos números globais do ano.

Em 2020, foram informados à Organização Mundial da Saúde (OMS) mais 127.396 casos, dos quais 19.195 (15,1%) ocorreram na região das Américas, sendo 17.979 notificados no Brasil, ou seja, 93,6% do número de casos novos das Américas. Brasil, Índia e Indonésia reportaram mais de 10 mil casos novos, correspondendo a 74% das notificações feitas em 2020. Em número de casos de hanseníase, o Brasil é o segundo no mundo, atrás apenas da Índia.

REFLEXOS DA PANDEMIA – Neste ano, o boletim epidemiológico publicado sobre a doença, com dados referentes a 2021, informa que o Brasil diagnosticou 15.155 casos novos de hanseníase. Os números mostram queda, que pode chegar a até 50% em algumas regiões, relacionada à pandemia de covid-19.

A pandemia prejudicou a procura de tratamento. A preocupação da SBD é orientar a população, dar acesso ao tratamento, fazer com que as pessoas conheçam os sintomas e se curem, antes de ocorrerem danos maiores, quando a doença alcança os nervos e prejudica os movimentos.

Da Redação*

TOLEDO

*Com informações da Agência Brasil – Por Alana Gandra

Janeiro Roxo: “Ainda temos muito que avançar”, afirma dermatologista

A falta de informação ainda gera preconceito – Foto: Janaí Vieira

A hanseníase é uma doença causada por uma bactéria que atinge, primordialmente, pele e nervos periféricos; nas formas mais graves, pode atingir outros órgãos; ela também é conhecida como lepra. O contágio pode ocorrer quando a pessoa convive, durante muito tempo, com outra que possui a doença. Entretanto, apenas uma pequena parcela da população que entra em contato com a bactéria pode desenvolver a doença.

“A hanseníase é uma doença infecciosa, contagiosa, crônica, provocada por bactéria e que atinge a pele, mucosas e nervos, podendo provocar danos irreversíveis, como dificuldade de andar ou de segurar objetos, entre outros. O contágio acontece pelas gotículas de água eliminadas pelo doente pela respiração, principalmente. Há necessidade de uma longa convivência com o doente. Nem todos os doentes transmitem. Só aqueles que têm mais bactérias. E nem todas as pessoas são suscetíveis à bactéria causadora. Há pessoas que têm uma resistência natural”, enfatiza o médico dermatologista e professor universitário, Orley Alvaro Campagnolo.

A doença pode ser leve, intermediária e mais grave – casos em que o paciente tem grande quantidade de bactérias. O médico explica que é difícil traçar um perfil em relação as pessoas que não têm resistência natural as bactérias, contudo, ele pontua que pacientes imunodeprimidos por doenças, tratamentos médicos e carências nutricionais são mais suscetíveis. 

SINTOMAS DA DOENÇA – “Um dos sintomas mais marcantes e que faz pensar na doença é a perda da sensibilidade ao calor. Uma cozinheira, por exemplo, pode se queimar cozinhando, formar lesão grave na pele e nada sentir”, pontua o dermatologista. “Também chamam a atenção manchas amortecidas de pele, brancas ou vermelhas. Devemos citar ainda nódulos avermelhados, perda de cílios e das sobrancelhas, áreas de perda de pelos e redução da sudorese e aumento de volume das orelhas”.

A doença também pode levar a deformidades e a incapacidades físicas e motoras, além de grande sofrimento (morbidade).  Perfurações na planta dos pés, deformidade e perda da força muscular em membros, dificuldade de locomoção e outras, até mais graves, podem ser algumas das consequências da doença em pacientes não adequadamente tratados as quais interferem na sua qualidade de vida.

PREVIR E TRATAR – Em relação a prevenção da doença, o médico cita que ela acontece pela interrupção da cadeia de transmissão por meio da identificação (diagnóstico) e tratamento dos doentes. Orley acrescenta que apesar de longo o tratamento, o paciente deixa de transmitir logo nas primeiras doses.

“O tratamento é feito com uma combinação de medicamentos orais, sob a forma de comprimidos. O tempo de tratamento pode variar de seis a 12 meses. Vai depender da forma clínica que o paciente apresenta. O medicamento é disponibilizado 100% pelo Sistema Único de Saúde (SUS) de forma gratuita e não se encontra à venda em farmácias. Existe cura e se adequada e precocemente tratado, raramente ficam sequelas”, comenta.

QUALIDADE DE VIDA – “Qualquer doença de pele exuberante e ativa, por si só, já é um transtorno para o indivíduo. Além disso, a perda de sensibilidade e, dependendo da forma clínica, reações graves, dolorosas e agudas com lesões de pele, dores articulares, febre e inchaços podem afastar por completo o paciente do trabalho e do convívio social. Também pode causar sequelas motoras, cegueira, úlceras que não cicatrizam nas plantas dos pés com evidente prejuízo ao doente e isso tudo interfere na qualidade de vida”, salienta.

Para ter qualidade de vida, assim que o paciente recebe o diagnóstico, ele precisa contar com uma rede de apoio para receber o tratamento adequado. Segundo o médico, esse rede é composta por dermatologistas, infectologistas e clínicos com treinamento específico. Além deles, também integram os atendimentos os profissionais da área de enfermagem, técnicos de enfermagem, farmacêuticos, bioquímicos (pesquisa do bacilo) e fisioterapeutas.

AINDA EXISTE PRECONCEITO – O dermatologista declara que a difusão do conhecimento reduziu, mas não aboliu o preconceito, visto que determinados comportamentos são muito arraigados. Ele cita que uma parcela da população sabe que o doente tratado não oferece risco à população, diante disso, o paciente compartilha apenas com as pessoas muito íntimas seu quadro de saúde.

“A alta incidência de hanseníase representa uma vergonha para nosso país. Não devemos medir esforços para erradicá-la. Apesar do tamanho e da complexidade de nossa nação, temos plenas condições para isso, basta ver inúmeras e desafiadoras ações bem sucedidas no âmbito sanitário que o Brasil é exemplo para o mundo, como no combate a AIDS. No mundo desenvolvido existem motivos para celebrar o Dia Mundial de Combate e Prevenção da Hanseníase, infelizmente, não no Brasil. Somos o segundo país do mundo em número de casos, perdendo apenas para a Índia, cuja população é muito maior. Ainda temos muito que avançar”, finaliza o médico.

Da Redação

TOLEDO

Doença tem tratamento gratuito ofertado pelo SUS

Casos mais específicos poder ser atendidos no CTA/SAE do Ciscopar – Foto: Janaí Vieira

A hanseníase é uma doença de acompanhamento na Atenção Primária em Saúde. O diagnóstico, o acompanhamento e o tratamento deste agravo acontece nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs). Na 20ª Regional de Saúde, casos mais específicos poder ser atendidos no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA/SAE) do Consórcio Intermunicipal de Saúde Costa Oeste do Paraná (Ciscopar).

No CTA/SAE, o atendimento para a hanseníase conta com profissional especializado nesta condição. “A médica dermatologista e hansenologista, Dra. Fabiola Welter Ribeiro”, relata a coordenadora do CTA/SAE, Jéssica Leonita Sartor. “A médica realiza o atendimento de pacientes portadores de Hanseníase em casos de prorrogação de tratamento poliquimioterápico da hanseníase, substituição de poliquimioterapia, orientação em caso de dificuldades para diagnóstico e tratamento, avaliação e diagnóstico de reações hansênicas, neurites e incapacidades, bem como realiza validação de tratamento e avaliação para casos de suspeita de resistência medicamentosa e /ou recidiva da doença”, explica.

DADOS CTA/SAE – Atualmente no CTA/SAE temos 242 pacientes de Hanseníase em acompanhamento/monitoramento. Em 2021, tivemos 34 pacientes de hanseníase que necessitaram iniciar acompanhamento no setor. No ano posterior, foram 28 pacientes, e no primeiro mês de 2023 já foram quatro novos pacientes no ambulatório de hanseníase do CTA/SAE.

Jéssica pontua que a hanseníase é uma doença infecciosa, contagiosa e de evolução crônica e que não causa só danos à saúde, mas também sociais. “Mesmo sendo uma doença tão antiga, a hanseníase coloca-se como um importante problema de saúde púbica no país e a campanha Janeiro Roxo traz o lembrete de que é necessário voltarmos nossos olhares para evoluir nos diagnósticos e no acompanhamento dos pacientes acometidos por essa condição”, aponta.

ANÁLISE 20ª REGIONAL DE SAÚDE – O chefe da 20ª Regional de Saúde, Fernando Pedrotti, explica que os dados são sempre analisados em intervalos de 12 meses. Em janeiro é feita uma análise dos últimos doze meses – o que representa exatamente o ano anterior.

“Quando em fevereiro, por exemplo, a análise será de fevereiro do ano anterior até janeiro do presente ano. A isso chamamos de coortes. A análise do ano de 2022 demonstra um percentual de 87.5% de cura. Contudo, essa análise precisa ser feita à luz do protocolo de tratamento que prevê que para a forma paucibacilar da doença, o tratamento deverá durar seis meses, podendo ser feito em até nove meses de uso da medicação. E para a forma multibacilar, o tratamento dura 12 meses, podendo ser feito em até 18 meses. Ou seja, 87,5% dos pacientes com diagnóstico de hanseníase concluíram seu tratamento dentro do preconizado na rotina (seis meses para a forma paucibacilar e 12 meses multibacilar). O que não significa que aqueles que estão em tratamento, cujo tempo irá durar até nove ou 18 meses, a depender da forma, abandonaram o tratamento”, conclui Pedrotti.

Da Redação

TOLEDO

Profissionais recebem capacitação contínua em relação ao combate e tratamento da doença

Foto: Janaí Vieira/Arquivo JO

O mês de janeiro, conhecido como Janeiro Roxo, é marcado pelas campanhas de prevenção à Hanseníase, oficializada pelo Ministério da Saúde e endossada pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD). O Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA/SAE) do Consórcio Intermunicipal de Saúde Costa Oeste do Paraná (Ciscopar) e a 20ª Regional de Saúde também levantam essa bandeira e promovem capacitações dos profissionais.

Com o intuito de contribuir com a campanha, a prevenção e o tratamento precoce da hanseníase, bem como somar no aperfeiçoamento dos profissionais de saúde dos 18 municípios de abrangência do Ciscopar e da 20ª Regional de Saúde na próxima terça-feira (31) acontece um encontro para discussão sobre o tema.

A capacitação será realizada no auditória da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), campus Toledo. O evento contará com a participação da Dra. Fabiola Welter Ribeiro, da enfermeira da Vigilância Epidemiológica de Toledo, Marlene Ensina, e da assistente social, Rosana Souza, que atua na Divisão da Promoção da Equidade em saúde da Secretaria de Estado de Saúde do Paraná (SESA).

O enfrentamento desta doença depende de um lado, do aperfeiçoamento e implementação plena de políticas públicas e do outro lado, de que cada pessoa faça a sua parte e esteja atento ao próprio corpo, procurando orientação médica em caso de sinais e sintomas suspeitos.

CAPACITAÇÃO CONTÍNUA – “Os profissionais precisam estar capacitados possibilitando que eles tenham um olhar mais refinado para os sinais e sintomas da doença, permitindo o diagnóstico precoce”, declara a coordenadora do CTA/SAE, Jéssica Leonita Sartor. “A recente pandemia pela Covid-19 causou grande impacto nos serviços de saúde e no acompanhamento das outras doenças, por isso é tão necessário retomar as ações e campanhas de prevenção e treinamentos nesta temática”.

Segundo Jéssica, o Ciscopar, por meio do CTA/SAE, tem previsto no cronograma do núcleo de educação permanente a realização de capacitações, treinamentos e reuniões junto aos municípios de abrangência do Consórcio. Ela destaca que esses momentos tem como objetivo aproximar os serviços de saúde, atualizar os profissionais sobre os agravos e qualificá-los para que se torne possível atendimento integral e precoce no diagnóstico de qualquer condição. “Os treinamentos acontecem tanto nos serviços de saúde, quando o município possui alta demanda e dificuldade no manejo, como de forma abrangente, para maior número de profissionais”, conclui Jéssica.

Da Redação*

TOLEDO

*Com informações do Ciscopar

Bacilo

O bacilo causador da hanseníase foi identificado no século 19, pelo médico norueguês e pesquisador de saúde pública Gerhard Armauer Hansen. Naquela época, a doença já carregava preconceito, segregação e era chamada de lepra, em tom pejorativo. Por conta do sobrenome do pesquisador, a doença passou a ser chamada hanseníase. Passados quase 150 anos, profissionais da saúde ainda promovem campanhas de esclarecimento e ações na mídia para desmitificar a hanseníase.

Por Alana Gandra

Agência Brasil

RIO DE JANEIRO

...
Você pode gostar também
Deixe uma resposta

Seu endereço de email não será publicado.